quinta-feira, 24 de maio de 2012

Crime e castigo

Já está valendo. Entrou em vigor, na quarta, 16, a lei 12.527/2011, conhecida como Lei de Acesso à Informação, que tem como objetivo garantir, a todo cidadão brasileiro, acesso aos dados oficiais do Executivo, Legislativo e Judiciário. A Lei, que vale em âmbito federal, estadual, municipal e distrital, manda que cada órgão tenha um SIC (Serviço de Informação ao Cidadão) para garantir que dados públicos sejam disponibilizados a quem porventura os solicite.

A nova Lei é irmã caçula da Lei Complementar 131, de Responsabilidade Fiscal, que obriga todo órgão público a disponibilizar, na internet, informações pormenorizadas sobre suas execuções orçamentárias (receitas e despesas), em tempo real. Ocorre que a irmã mais velha nasceu em maio de 2009, e nossos políticos ainda fingem desconhecê-la. É certo que, para cidades como Barcarena, com cem mil habitantes, a Lei tenha passado a valer a partir de maio do ano passado. Mesmo assim! O poder público barcarenense (executivo e legislativo) a descumpre já faz um ano, e nada acontece. É como se você fosse proprietário de um comércio, e o gerente, mancomunado com o caixa, não prestasse conta da féria do dia.

Isso me fez lembrar de um dos maiores romances de todos os tempos, Crime e Castigo, do escritor russo Fiódor Dostoievski, no qual o protagonista Rodion Raskólnikov assassinou Alena Ivánovna (uma agiota), e depois Isabel Ivánovna, irmã da primeira vítima. Rodion cumpriu pena na Sibéria, após ter confessado, perseguido pelo remorso, o que havia cometido. O Brasil tem uma enormidade de leis. O problema é que muitas delas não são cumpridas, e ao contrário da personagem de Dostoievski, ninguém sequer sente remorso. Não basta ter leis, é preciso fazer cumpri-las. No entanto, por aqui a Prefeitura é criminosa, a Câmara é cumplice e o Ministério Público é omisso. Sendo assim...

Reagir é preciso

O ativista político Martin Luther King, Nobel da Paz em 1964, disse certa vez em um dos seus discursos: “O que me preocupa não é o grito dos violentos, nem dos corruptos, nem dos desonestos, nem dos sem ética. O que mais me preocupa é o silêncio dos bons”. Seguidor das ideias de desobediência civil pacifica propagadas por outro grande líder, Mahatma Gandhi, Luther King dedicou a vida em prol dos direitos civis dos negros dos Estados Unidos, liderando manifestações pelo direito ao voto e pelo fim da segregação, entre outros direitos até então negados aos negros norte-americanos.

A frase de Luther King me veio à memória a propósito do que ocorre atualmente em Barcarena, onde o poder público, constantemente, tripudia da população, e ninguém reage. Nossos políticos faltam ao trabalho, faltam com o decoro, descumprem a lei, e não acontece nada. Até quando assistiremos impassíveis a esta situação? Onde estão os políticos de oposição, se é que existe oposição em Barcarena? Candidatos, temos aos montes, mas, ao que parece, nenhum disposto a bater de frente e mudar as coisas.

Reagir é preciso. É chegada a hora do cidadão de bem mostrar sua indignação. É chegada a hora da desobediência civil. É chegada a hora de, assim como Gandhi e Luther King, manifestar nosso desagrado. Se não é assim, qual o exemplo que queremos passar para a nossa juventude? É preciso refletir sobre o que disse Rui Barbosa, há quase cem anos (em 1914), durante discurso no Senado: “De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto”.

A força do inesperado

Bela e sábia a prece atribuída a São Francisco de Assis, que diz “Senhor, dai-me força para mudar o que pode ser mudado, resignação para aceitar o que não pode ser mudado e sabedoria para distinguir uma coisa da outra”. Faz parte do ser humano mudar o que o cerca em busca de melhoria de vida, assim como faz parte aceitar a rotina do dia-a-dia, mesmo ao se tratar de coisas que nos desagradam. São incontáveis as vezes em que somos obrigados a “engolir sapo” e seguir em frente. Com o passar do tempo, conformados, terminamos por acreditar que aquilo que se tornou comum por rotina seja algo natural e imutável.

A classe política barcarenense acostumou a nossa população a um estado de letargia tal, que até assuntos que antes eram tratados à calada da noite, hoje são expostos ao tagarela do dia, e aceitamos tudo como sendo a ordem regular das coisas; afinal, como costumamos dizer, “política é coisa suja”. Acabou o decoro, acabou a vergonha. A Câmara de Vereadores é um claro exemplo dessa relação sadomasoquista, onde os masoquistas somos nós, o povo. Parlamentares, quando comparecem ao trabalho, tratam de interesses particulares, diretamente da tribuna, mandando recados e ameaças a quem ousa atrapalhar seus proveitos e cobiça.

Faz tanto tempo que as coisas são assim na nossa cidade, que já nem mesmo os políticos acreditam que possa haver mudança nesse estado de coisas. Por isso abusam, escarnecem, tripudiam. Não contam que a paciência dos cidadãos possa estar se esgotando, e que, a qualquer momento, pode surgir a força do inesperado.

quarta-feira, 2 de maio de 2012

Dinheiro saindo pelo ladrão!


Todo mundo sabe, de cor e salteado, que Barcarena tem uma das maiores arrecadações do Pará. Todo mundo sabe, de cor e salteado, que Barcarena, mesmo tendo uma das maiores arrecadações do Pará, é um município cheio de mazelas. Por aqui falta tudo. Falta transporte público decente, falta asfalto nas ruas, falta emprego para boa parte da população, falta escola de qualidade, falta hospital devidamente equipado... Barcarena é assim, e todo mundo sabe, de cor e salteado, o motivo: por aqui, falta, principalmente, político com vergonha na cara.

Barcarena tem uma das maiores arrecadações do Pará e ninguém, com exceção do punhado de políticos que lidam com essa verba, sabe quanto o município arrecada. É dinheiro saindo pelo ladrão, e o executivo não informa o quanto recebe, tampouco o quanto gasta, e o legislativo, esse, por sua vez, não fiscaliza. Também pudera, como poderia, o legislativo, fiscalizar alguma coisa, se esse poder também não presta conta dos seus próprios gastos? Que moral teria? Pode o sujo falar do mal lavado?

É grande o descaramento dos nossos políticos, que afrontam a população, dia após dia, descumprindo a Lei Complementar 131, que manda disponibilizar, em tempo real, na internet, informações pormenorizadas e atualizadas sobre suas receitas e despesas. Enquanto o povo padece, o que não falta é político cuidando dos seus próprios interesses. O problema é que o povo padece, mas padece calado, mudo, silencioso, como se tudo isso fosse algo perfeitamente natural, normalíssimo. Se os nossos políticos perderam o pudor, a vergonha, é porque nós perdemos o espírito que tinham nossos antepassados, os cabanos. Perdemos, assim, a nossa capacidade de nos indignar, e mandar às favas esses que, na maior cara de pau, tanto nos agridem.

O poder da informação


Nesta edição, o Jornal O Cidadão publica cor­respondência da leitora Francinete Cabral, sob o título “Senhor cidadão, você é o pa­trão” (página 02, na coluna Leitor). A carta em questão faz menção a uma outra, de au­toria do leitor Souza Junior, que foi publicada na edi­ção anterior, na mesma página e coluna, com o título de “Lamentável”. O assunto das duas missivas: o esta­do deplorável em que se encontra o nosso município.

Desde que começou a circular, em julho de 2010, O Cidadão vem trazendo à tona questões envolvendo transporte público, Saúde, Educação, contas públicas, etc. Da primeira à atual edição, buscamos cumprir nossa missão, que é a de informar com clareza e isen­ção, bem como, a de fazer um chamamento ao debate público, transparente, cristalino; de forma que cada munícipe possa contribuir ativamente para a solução dos inúmeros problemas que nos afligem.

O início da nossa trajetória foi difícil, uma vez que a população da nossa cidade, já tantas vezes enganada, olhou-nos com desconfiança. No entanto, o nosso tra­balho constante em busca da informação isenta, alia­do à coragem de, sempre que necessário, enfrentar os poderosos de plantão, nos alçou à condição de fiscal da coisa pública. Os dois leitores citados acima muito nos honra, ao usar esse veículo de comunicação como arma contra a malversação e o descaso. 

Dizem alguns que a imprensa seria, ao lado do le­gislativo, executivo e judiciário, o quarto poder. Dis­cordo dessa afirmação. Poder tem o povo, quando se mantem alerta e bem informado. Como reza a filosofia de Francis Bacon, “saber é poder”.

Vai dar burro


Já faz algum tempo, vem sendo discutido, na Câmara Municipal, o número de acentos na Casa para a próxima legislatura. O tempo passa, e até o momento não se chegou a uma conclusão. São muitos os vereadores que defendem, da tribuna, um número maior de vagas (conforme possibilita a legislação federal, que limita em 17 cadeiras, para municípios com 100.000 ha­bitantes – como é o caso de Barcarena – em vez das 10 atuais). A sensação que se tem é que a grande maioria quer a mudança. Porém, inexplicavelmente, a decisão sempre é protelada.

Que a Câmara de Vereadores é lerda, não é novidade pra ninguém. Já houve sessão em que esse assunto não foi à votação, simplesmente por falta de quórum, algo que também não é novidade, uma vez que, salvo raras exceções, os atuais vereadores barcarenenses não gostam muito de comparecer à única sessão semanal da Casa. Dirigentes de vários partidos, além de outras pessoas interessadas em concorrer às próximas eleições, vêem ocupando com frequência a tribuna do legislativo, cobrando uma definição, e nada conseguem, a não ser promessas vãs. Se, mesmo com tamanha pressão, não se chegou a uma definição para o assunto, é claro que alguma coisa estranha está acontecendo.

Barcarena precisa mesmo ter 17 vereadores. Mais que isso, precisa ter 17 vereadores que trabalhem. O município cresceu em população e também em problemas, e 17 parlamentares dariam mais representatividade à Casa. Entretanto, o número atual, de 10 cadeiras, deve prevalecer, uma vez que interessa ao executivo. Do jeito que está, é mais fácil manter a atual conjuntura situacionista, de unanimidade. A propósito, segundo Nelson Rodrigues, toda unanimidade é burra. E 10 é burro, no jogo do bicho.

Lágrimas de crocodilo


Já está ficando repetitivo. O vereador Ary Santos foi acometido, mais uma vez, por uma crise de lamentação, na sessão ordinária da terça-feira 03, da Câmara, e voltou a reclamar do Jornal O CIDADÃO, dizendo-se injustiçado porque este periódico o teria chamado de inepto.

Inepto, no entanto, é pouco para um vereador que também é lerdo, omisso, negligente, interesseiro, mentiroso, pusilânime, complexado, confuso, fingido, preconceituoso, gabola... Sem contar ser também puxa-saco do prefeito João Carlos Dias, alcunha que, por sinal, ele próprio se aplicou, da tribuna da Câmara, quando vertia lágrimas por não ter conseguido, após anos de bajulação, ficar à frente da Secretaria de Saúde, cargo que, a propósito, desejava assumir por apenas três meses, em pleno ano eleitoral, em flagrante tentativa de dar uma “saúde” em sua campanha. O choramingo do parlamentar se dá porque eu voltei a lhe cobrar a regulamentação do transporte público, coisa que ele, embora esteja incumbido de fazer, não faz. Em vez de reagir às críticas e por as mãos na massa, o edil prefere chorar, e, levianamente, acusar o Jornal de estar recebendo dinheiro para criticá-lo. No mais, diz estar esperando resposta da Secretaria de Obras e Transporte a dois requerimentos que fez sobre o assunto, isso no ano passado.

Quero ver o que aconteceria se o executivo se “esquecesse” de repassar a polpuda verba da Câmara Municipal. Será que ele ficaria esperando? Duvido muito. Enquanto Ary Santos insiste em suas evasivas, a população continua à mercê de um transporte público caótico, que vira abóbora às sete da noite, forçando o usuário a gastar com táxi. Que me perdoe o parlamentar, mas sou fã mesmo é de Geraldo Vandré, que diz em uma de suas canções: “quem sabe faz a hora / não espera acontecer”.